23 de setembro de 2013

Irradia agora habitada surpresa.


António Ramos Rosa
17 de Outubro de 1924 - 23 de Setembro de 2013

Nascimento último

Como se não tivesse substância e de membros apagados.
Desejaria enrolar-me numa folha e dormir na sombra.
E germinar no sono, germinar na árvore.
Tudo acabaria na noite, lentamente, sob uma chuva densa.
Tudo acabaria pelo mais alto desejo num sorriso de nada.
No encontro e no abandono, na última nudez,
respiraria ao ritmo do vento, na relação mais viva.
Seria de novo o gérmen que fui, o rosto indivisível.
E ébrias as palavras diriam o vinho e a argila
e o repouso do ser no ser, os seus obscuros terraços.
Entre rumores e rios a morte perder-se-ia.


E este, um dos meus poemas eternos:

Não posso adiar o amor

Não posso adiar o amor para outro século 
não posso 
ainda que o grito sufoque na garganta 
ainda que o ódio estale e crepite e arda 
sob montanhas cinzentas 
e montanhas cinzentas 

Não posso adiar este abraço 
que é uma arma de dois gumes 
amor e ódio 

Não posso adiar 
ainda que a noite pese séculos sobre as costas 
e a aurora indecisa demore 
não posso adiar para outro século a minha vida 
nem o meu amor 
nem o meu grito de libertação 

Não posso adiar o coração 

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