5 de julho de 2008

Hoje roubei todas as rosas dos jardins e cheguei ao pé de ti de mãos vazias...*

Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras
ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim.

- Eugénio de Andrade -*

4 de julho de 2008

3 de julho de 2008

E um olhar perdido é tão difícil de encontrar como o é congregar ventos dispersos pelo mar...*


Há sempre uma madrugada
em que os candelabros de ouro enaltecem
as tuas formas,
a tua alquimia de pecado e volúpia,
há sempre,
no teu sorriso breve,
uma brisa que regressa do mar,
trazendo o lamento dos náufrafos,
a sua sede irremediável.
Nestas horas de assassinada alegria
ergues os braços e uma súplica,
mas ninguém te ouve, ninguém te vê,
encerrada numa túnica de cores puras.

- José Agostinho Baptista -
* Ruy Belo

2 de julho de 2008


As minhas palavras aqui são como as palavras escritas num papel branco que se mantém branco com essas palavras invisíveis de alguém que as leia, palavras a envelhecerem por não haver quem as compreenda, a perderem o seu significado, a misturarem-se imperceptíveis numa brisa em que ninguém repara. (…) todo o meu olhar é desperdiçado por saber que tu não vês nada.

- José Luís Peixoto, in Nenhum Olhar -