3 de julho de 2009

Um teatro por dentro...

Mapa de Anatomia: O Olho
 
O olho é uma espécie de globo,
é um pequeno planeta
com pinturas do lado de fora.
Muitas pinturas:
azuis, verdes, amarelas.
É um globo brilhante:
parece cristal,
é como um aquário com plantas
finamente desenhadas: algas, sargaços,
miniaturas marinhas, areias, rochas,
naufrágios e peixes de ouro.
Mas por dentro há outras pinturas,
que não se vêem:
umas são imagens do mundo,
outras são inventadas.
O olho é um teatro por dentro.
E às vezes, sejam atores, sejam cenas,
e às vezes, sejam imagens, sejam ausências,
formam, no olho, lágrimas.

- Cecília Meireles -

White City of Lights
















Ando há dois dias viciada nesta cancão. A culpa é do PRD. Também não conhecia. Amei cada pedacinho. Já tinha dito que estou novamente apaixonada por Lisboa?!

2 de julho de 2009

Da saudade...


 Tive amigos que morriam, amigos que partiam

Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.

Odiei o que era fácil

Procurei-te na luz, no mar, no vento.


Sophia por Eduardo Gageiro

O poema

O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Como rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo

1 de julho de 2009

Gotta chase my Soul!


Slow, Slow (Run Run) (live) - Ayo

What have I become is that really me?
Look what I have done this is not who I wanna be
I gotta face myself gotta chase my Soul
Gotta free my mind get back my glow
I got to go
Yes I got to

Run run run run run run
Run for my Soul
I better go go go go go go
Making sure I go slow slow

I got to run run run run run run
Run for my Soul
I better go go go go go go
Making sure I go slow slow

I got to free my mind I got to chase my Soul I got to be myself I got to find my glow

Things are getting strange guess I need a change
But I can't run away no I can't escape
I got to face myself got to free my mind
I got to chase my Soul get back my glow
I got to go
Yes I got to

Run run run run run run
Run for my Soul
I better go go go go go go
Making sure I go slow slow

30 de junho de 2009

A queda dum anjo...


Foi-lhe diagnosticado um cancro há 5 dias. Morreu hoje. O mundo ficou infinitamente mais pobre. Encontrar-nos-emos para sempre no Café Müller.

29 de junho de 2009

London.London

I'm wandering round and round, nowhere to go
I'm lonely in London and London is lonely so
I cross the streets without fear
everybody keeps the way clear
I know, I know no one here to say hello
I know they keep the way clear
I am lonely in London without fear
I'm wandering round and round here nowhere to go

while in my eyes
go looking for flying saucers in the sky

oh Sunday, Monday, autumn pass by me
and people hurry on so peacefully
a group approaches a policeman
he seems so pleased to please them
it's good at least to live, and I agree
he seems so pleased, at least
and It's so good to live in peace
and Sunday, Monday, years, and I agree

while my eyes
go looking for flying saucers in the sky

I choose no face to look at, choose no way
I just happen to be here, and It's ok
green grass, blue eyes, grey sky, God bless
silent pain and happiness
I came around to say yes, and I say

but my eyes
go looking for flying saucers in the sky

- de Caetano Veloso, por Cibelle e Devendra Banhart -

28 de junho de 2009

Era uma vez...

Faz de conta que ela era uma princesa azul pelo crepúsculo que viria, faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos, faz de conta que uma veia não se abrira e faz de conta que sangue escarlate não estava em silêncio branco escorrendo e que ela não estivesse pálida de morte, estava pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz-de-conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz-de-conta verde cintilante de olhos que vêem, faz de conta que ela amava e era amada, faz de conta que não precisava morrer de saudade, faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus, faz de contaque vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte, faz de conta que ela não ficava de braços caídos quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio, faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de marinheiros que lhe atavam os pulsos, faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua, faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos da gratidão mais límpida, faz de conta que tudo o que tinha não era de faz-de-contafaz de conta que se descontraíra o peito e a luz dourada a guiava pela floresta de açudes e tranqüilidade, faz de conta que ela não era lunar, faz de conta que ela não estava chorando.

- Clarice Lispector -

Breathe in breathe out...










Tenho uma guerra dentro da minha pele.
Necessito respirar.

- Egito Gonçalves -

Porque as palavras depois se reconstroem...

O exacto curso do rio

Exactamente como foi, o medo de me enganar
mais tarde na memória - é tudo o que me resta: estar
de noite às escuras a pensar em ti

E se me lembro mal, se troco as vezes, naquela
quinta-feira o dia do amor em vez de ser
na quarta, o erro surge-me gigante,
um peso carregado como Atlas

Por isso é que preciso de lembrar coisas
exactas, como aconteceu tudo; não só
transpor depois  na ficção recolhida, sou eu
que te preciso e dos teus dias
que me foram meus

Lembrar-me exactamente como foi, o que usei
nesse dia e o que usei no outro, até que horas
tudo, se havia gente ou n ão
e em que dia. Porque as palavras depois se
reconstroem

O que se disse então torna-se fácil.
Assim dito parece coisa pouca,
lugar comum e
fácil, mas as noites são grandes

e lembrar-te
exactamente,
de uma forma correcta

é-me tão importante
dentro das noites a pensar em ti
sabendo: não te vejo nunca mais

- Ana Luisa Amaral, in Imagias -