7 de março de 2014

London 1.



Acton Town station
Acton - west London

A única coisa que levávamos marcado era um pequeno hostelzinho/b&b, escolhido pela conveniência do local. A proximidade em relação à Piccadilly Line era vital, uma vez que no dia da entrevista teria que me apresentar às 8h da manhã. A relação qualidade/preço é francamente boa, para além de ser bastante em conta para os preços praticados na cidade. É humilde, mas a simpatia e disponibilidade de todos compensa o que possa faltar em conforto e oferta de serviços. Se alguma vez forem a Londres com um budget apertado, como foi o nosso caso, poderá ser uma hipótese a considerarem. Não nos pagam pela publicidade, mas gostamos de passar a palavra quando achamos que vale a pena.

Acton fica localizado na zona oeste da cidade. Pelo que conseguimos perceber, é uma zona bastante habitada por imigrantes - polacos, indianos, sul-africanos, somalianos, havendo uma variedade imensa de restaurantes com cozinha de diversos países, assim como muito comércio explorado por imigrantes de várias nacionalidades. Uma diversidade cultural que enche as ruas de um colorido muito particular e transforma uma banal viagem de autocarro ou de metro num verdadeiro melting pot e um desafio para todos os sentidos. A quantidade de línguas diversas que é possível ouvir em apenas 5 minutos é de deixar qualquer um abananado, tentando perceber de que língua se trata. Um pequeno laboratório do que se pode encontrar um pouco por toda a cidade.

Chegar a uma cidade que sempre se desejou conhecer, sobre a qual já tanto tinha lido, sonhado, projectado, da qual já tinha visto tantas imagens e ouvido tantos relatos, é uma sensação estranha e algo difícil de descrever. Por um lado, tudo é novidade, o nosso olhar parece não conseguir abarcar tudo o que queremos ver, os outros sentidos quase têm um curto-circuito, tamanha a adrenalina, a emoção, os cheiros, os sons, as imagens para processar. Por outro, a sensação de dèja vu é uma constante, há uma familiaridade em tudo que nos comove, como se estivéssemos a entrar em casa de um velho amigo que não visitamos há muito tempo.

Para a Pequenina, esta foi a terceira visita a Londres, pelo que muito do que eu ia vivendo e experimentando era guiado pelo olhar conhecedor dela. A cidade que eu vi durante aqueles curtíssimos quatro dias foi, também por isso, o filme que ela produziu e me foi mostrando, rua após rua. Uma película de afectos, de memórias de infância, referências literárias e cinéfilas. Uma busca pela cidade que levávamos dentro de nós e fomos revendo e encontrando passo a passo, nos muitos quilómetros que fizemos, ao frio e à chuva, calcorreando tanto quanto o tempo disponível nos permitiu. 

Ficou ainda tanta coisa por ver, tanta coisa por fazer, tantos sítios onde nos queríamos simplesmente sentar a sentir o pulsar da cidade e ver as suas gentes passar. Não houve tempo para isso, mas, ainda assim, acho que conseguimos captar um pouco da alma londrina. À nossa maneira, através dos mais variados filtros que constituem cada uma de nós. Uma janelinha aberta sobre a cidade que vos vamos trazendo, na expectativa de que possa servir a alguém. 

No fundo, no fundo, um exercício para a (nossa) memória futura. Uma tentativa de fazer perdurar por mais tempo aquela sensação boa de se fazer um novo amigo para a vida - porque queremos voltar a Londres todas as vezes que nos for possível e desvendar todos os seus mistérios. 

6 de março de 2014

☀︎



Anunciam-se dias com temperaturas a rondar os 20º quase em todo em país, céu azul e o sol a brindar-nos com a sua presença pelo menos até 2ªfeira. Ontem, no FB de uma amiga, depois de ela ter postado a notícia que dáva conta de dias tão afortunados, disse-lhe que temia que na próxima semana andássemos todos outra vez a cantar são as águas de Março fechando o Verão, depois de dias anormalmente quentes, voltando a mesmice da chuva e dos dias cinzentos, que tem sido a constante deste já (demasiado) longo Inverno. Prefiro uma transição para a Primavera mais suave, mas em crescendo, claro, com tudo aquilo a temos direito. Brisas matinais a puxar um pouco de calor para a tarde, noites a cheirar a flores que entretanto foram crescendo nos baldios e em todos os canteiros que conseguiram, as andorinhas e todos os pássaros a regressarem até nós e o seu chilrear a lembrar-nos que depois da tempestade vem sempre a bonança. Não quero que o Verão me atropele a Primavera, por mais desesperada por sol e calor que eu esteja. Bem sei que só se anunciam uns amenos 20º graus, mas já se houve falar num Verão escaldante, o mais quente dos últimos não sei quantos anos, e eu preciso que esta transição seja o mais suave possível, podendo ver a Natureza desabrochar em todo o seu esplendor sem, literalmente, queimar etapas.

No entanto, o céu azul de hoje soube-me pela vida, só me apetecia andar com a cara virada para o sol, saboreando cada raio. Apetecia-me ter ido até á beira mar, sentar-me na areia a fazer a fotossíntese, enquanto ouvia Charles Mingus ou Thelonious Monk, por exemplo, sem nunca tirar os olhos do mar. A realidade foi outra - talvez o fim-de-semana me conceda esse desejo. 

5 de março de 2014

Just breathe.

In the quiet of a shadow 
In the corner of a room 
Darkness moves upon you 
Like a cloud across the moon 

You're aware in all the silence 
Of a constant that will turn 
Like the windmill left deserted 
Or the sun forever burn 

So don't forget to breathe 
Don't forget to breathe 
Your whole life is here 
No eleventh hour reprieve 
So don't forget to breathe 

Keep your head above water 
But don't forget to breathe 

And all the suffering that you've witnessed 
And the hand prints on the wall 
They remind you how it's endless 
How endlessly you fall 

Then the answer that you're seeking 
For the question that you found 
Drives you further to confusion 
As you lose your sense of ground 

So don't forget to breathe 
Don't forget to breathe 
Your whole life is here 
No eleventh hour reprieve 
So don't forget to breathe 

Keep your head above water 
But don't forget to breathe 

Breathe...

Don't forget to breathe 
Don't forget to breathe 
You know you are here 
But you find you want to leave 
So don't forget to... breathe 

Just breathe...

4 de março de 2014

Enquanto resistirem as asas.

Goza a euforia do voo do anjo perdido em ti
Não indagues se nossas estradas, tempo e vento
desabam no abismo.
que sabes tu do fim...
Se temes que teu mistério seja uma noite,
enche-o de estrelas
conserva a ilusão de que teu voo te leva sempre para mais alto
no deslumbramento da ascensão
se pressentires que amanhã estarás mudo, esgota como
um pássaro as canções que tens na garganta
canta, canta para conservar a ilusão de festa e de vitória
talvez as canções adormeçam as feras que esperam
devorar o pássaro
desde que nasceste não és mais que um voo no tempo
rumo ao céu?
que importa a rota
voa e canta enquanto resistirem as asas. 

- O voo, Menotti Del Picchia -

3 de março de 2014

Chocolate a la taza.



Todos os anos me pergunto por que razão ainda continuo a virar noites a contar estatuetas douradas, a conferir palpites e apostas, a comentar discursos e a fazer de conta que os Óscares são um big deal. O facto de gostar mesmo muito de cinema é um bom argumento. No entanto, e desde que me fui apercebendo do lado mais business da indústria cinematográfica, pondo um fim à minha inocência de espectadora infantil, esse argumento por si só parece não chegar, sobretudo quando sou tão crítica em relação a certas facetas de Hollywood, levando as pessoas a fazerem-me constantemente a mesma pergunta: então porque continuas a perder horas de sono?
Masoquismo poderá ser uma das respostas. A emoção de ver um espectáculo em directo, aquela adrenalina boa do ver acontecer, o saber tudo em primeira mão, também é tudo verdade. O estar sempre à espera que a qualidade do espectáculo em si melhore, que se superem, que fujam à mesmice de sempre. A oportunidade de ver os actores e as actrizes que mais me tocam num contexto diferente, despidos das personagens. Até mesmo para admirar um ou outro vestido, que faz tudo parte do espectáculo em si. 
Esta madrugada, enroscada no sofá a beber chá e a comer bolachas de aveia, chocolates e estrelitas como se fossem amendoins, ouvindo os comentários da cinéfila ao meu lado, lembrei-me da época em que assistia aos Óscares com o meu avô - e às vezes a minha mãe, quase sempre em período de férias de Carnaval, invariavelmente com uma caneca de chocolate quente na mão, feito com umas tabletes compradas nas Paquitas, em Alcañices. A avó Aninhas chamava-nos malucos e advertia-nos para as consequências de uma cozinha desarrumada pela manhã. Nós tínhamos uma das melhores noites do ano, discutindo de forma acalorada as nossas preferências, comigo a repetir que injustiça, avô, várias vezes madrugada fora. 
A recordação do sonho, o imaginário infindável, as imagens em movimento, as histórias, as personagens, as emoções, a eterna magia - é por tudo isto que continuo a ver a cerimónia, ano após ano, desde 1992. 

Somewhere over the rainbow
Way up high there's a land I heard of once in a lullaby
Somewhere over the rainbow
Skies are blue
And the dreams that you dare to dream
Really do come true

Someday I'll wish upon a star
And wake up where the clouds are far behind me
Where troubles melt like lemon drops
Away above the chimney tops
That's where you'll find me 

Somewhere over the rainbow
Bluebirds fly
Birds fly over the rainbow
Why then oh why can't I?

If happy little bluebirds fly
Beyond the rainbow why oh why can't I?

2 de março de 2014

London 0.




Pequenina @ Covent Garden Market

A tripartição da fotografia é propositada. Não é possível descrever a Pequenina em poucas palavras, pois toda ela é cheia de camadas, cores e humores. Daí a gradação de cor nas fotografias - uma tentativa de vos mostrar um pouco da autenticidade desta menina-mulher, da sua complexidade e originalidade.
Já viajámos muito as duas e contamos continuar a fazê-lo pela vida fora. Há pessoas que entram nas nossas vidas para connosco partilharem a estrada e todas as suas curvas e rectas, mais ou menos longas. 
É a companhia ideal, a melhor parceira de aventuras, o meu espelho e o meu oposto, tudo em simultâneo. Talvez por isso mesmo gostemos tanto de viajar juntas. Equilibramo-nos. Temos uma visão da vida e do mundo em tudo semelhante, mas formas algo distintas de fazer as coisas. Complementamo-nos. Somos muito boas a traçar roteiros flexíveis, que encaixam perfeitamente nas nossas personalidades. Os nossos orçamentos de viagem e referentes folhas de excel fariam corar qualquer ministro das finanças - não só sabemos como os planear, como também os cumprimos com uma flexibilidade consciente e sem nunca nos comprometermos financeiramente. Sabemos ultrapassar obstáculos, imprevistos e variações de humor.
Ela é mais stressada em momentos críticos e sofre antecipadamente muitas vezes por cenários pessimistas fabricados na sua fértil imaginação. Eu acredito sempre que tudo se resolverá e tudo acaba sempre por se resolver, mesmo que tenhamos de andar quase uma hora de mochila às costas ao redor de uma estação de comboios acabadinhas de chegar a Cracóvia, por exemplo (quando afinal o caminho que deveríamos ter seguido era tão mais simples). A verdade é que eu sou bastante teimosa e não gosto lá muito de pedir indicações logo assim à primeira, preferindo estudar detalhadamente mapas e afins, confiando no meu (quase sempre bom) sentido de orientação. Claro que por vezes seria bem mais simples perguntar a alguém como ir do ponto A ao ponto B quando nem sabemos muito bem onde estamos, ou seja, onde é o ponto A em primeiro lugar. Ela, produtora de formação e profissão, faz questão de me relembrar isso mesmo constantemente.

Desta vez, devo-lhe não apenas a companhia nesta pequena aventura, como, acima de tudo, o apoio incondicional. Não me deixou ir sozinha e isso vale todos os Big Ben do mundo.

É também o olhar dela sobre Londres que vos mostrarei ao longo deste mês - e como eu gosto de ver o mundo através dos olhos dela.