5 de novembro de 2009

Das heranças...

Testamento


Vou partir de avião

e o medo das alturas misturado comigo

faz-me tomar calmantes

e ter sonhos confusos

 

Se eu morrer

quero que a minha filha não se esqueça de mim

que alguém lhe cante mesmo com voz desafinada

e que lhe ofereçam fantasia

mais que um horário certo

ou uma cama bem feita

 

Dêem-lhe amor e ver

dentro das coisas

sonhar com sóis azuis e céus brilhantes

em vez de lhe ensinarem contas de somar

e a descascar batatas

 

Preparem a minha filha

para a vida

se eu morrer de avião

e ficar despegada do meu corpo

e for átomo livre lá no céu

 

Que se lembre de mim

a minha filha

e mais tarde que diga à sua filha

que eu voei lá no céu

e fui contentamento deslumbrado

ao ver na sua casa as contas de somar erradas

e as batatas no saco esquecidas

e íntegras


- Ana Luísa Amaral - 

Sem comentários: